Abaixo, com grifos meus, compartilho opinião extraída do livro "O BANQUEIRO DOS POBRES", autobiografia dasboas de Muhhamad Yunus, 68 anos, ganhador do Prêmio Nobel da Paz 2006, o qual foi dividido com o Grameen Bank, instituição que ele criou e já tirou mais de 15 milhões de pessoas da pobreza em Bangladesh (com mais de 135 milhões habitantes) e em outros países, dando-lhes direito ao microcrédito (SEM GARANTIA e com apenas 2% de inadimplência) para investir em seus próprios talentos, para aquisição de moradias, para mais de 60 mil estudantes universitários pobres etc.
"O feito do (Banco) Grameen ao conseguir dispensar o dinheiro dos doadores (Banco Mundial) me leva a considerar a questão da caridade.
Quando circulamos de carro por Daca (Capital de Bangladesh) somos atacados de todos os lados por mendigos profissionais. Nossa primeira reação é dar-lhes uma esmola. Por que não? Por alguns tostões, podemos aplacar nossa consciência. Quando somos abordados por um leproso com os dedos e as mãos devorados pela doença, ficamos tão chocados que imediatamente levamos a mão ao bolso e entregamos ao infeliz uma nota que para nós não é nada, mas representa uma fortuna para quem a recebe. Isso é útil? Não e na maioria das vezes é até danoso.
Aquele que dá fica com a impressão de ter feito alguma coisa. Mas não fez absolutamente nada.
Dar dinheiro dispensa-nos tranquilamente de encararmos o verdadeiro problema. Oferecendo uma soma irrisória ficamos com a consciência limpa. Mas, na verdade, limitamo-nos a nos livrar provisoriamente do problema. Mas por quanto tempo?
A caridade não é uma solução, nem a longo nem a curto prazo. O mendigo passará para o carro seguinte e recomeçará. E acabará por voltar a ver seu "benfeitor", de quem agora precisa para viver. Se queremos sinceramente resolver o problema, precisamos nos envolver e dar início a um processo. Se o doador abrisse a porta do carro para perguntar ao mendigo qual é o seu problema, como se chama que idade tem, se solicitou assistência médica, qual é a sua formação, então poderia talvez prestar-lhe um serviço. Mas entregar-lhe uma nota é implicitamente convidá-lo a sumir de vista para nos deixar em paz.
Não questiono o dever moral da ajuda nem o impulso que nos leva a ajudar os necessitados; condeno apenas a forma de que se reveste essa ajuda.
Do ponto de vista do beneficiário, a caridade pode ter efeitos desastrosos. Em muitos casos, ela desmotiva o mendigo a sair de sua situação. Quanto ao doente, ele nem sequer tenta se tratar, pois a cura significaria a perda dessa fonte de dinheiro. Há até mesmo casos, alardeados pela imprensa, de bandos de mendigos que punham recém-nascidos em potes para eles crescerem deformados; assim os mendigos profissionais poderiam transformá-los em instrumento destinado a amolecer o coração dos passantes.
Em todos os casos, a mendicância priva o homem de sua dignidade. Dispensando-o de prover as suas necessidades, ela o incita à passividade. Não é suficiente ficar sentado e estender a mão para ganhar a vida?
Quando vejo uma criança mendigando, resisto ao impulso natural de dar. Preciso admitir que às vezes me acontece de dar a esmola, sobretudo quando a miséria humana é tão terrível - um doente, uma mãe cujo filho está à beira da morte - que não posso evitar levar a mão ao bolso e dar alguma coisa. Mas sempre que é possível reprimo esse impulso."
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Já não pergunto mais aos religiosos (e àqueles que temos uma condição de ajudar) "O QUE você está fazendo ou QUAL a sua contribuição no mundo para minorar a pobreza e/ou o sofrimento alheio?".
Sinto que as perguntas precisam mudar para:
"COMO estamos dando nossa contribuição no mundo...?"
"O que é CARIDADE mesmo?"
"O que queremos de verdade (e de quem) quando fazemos um gesto de caridade?"
"Estamos efetivamente ajudando mesmo? Ou basta-nos "fazer a nossa parte"? E que parte é esta?"
2 comentários:
Caro Janio,
Belo texto. Difícil resistir a dar esmolas, em especial quando se trata de pessoas idosas e notadamente deficientes.
CONCORDO que a esmola, na maioria dos casos, incentiva o ócio. Mas, seguindo uma espécie de "intuição" a gente acaba por "selecionar" os que realmente necessitam dela. O correto, porém, está descrito no texto. O ato de dar esmola deveria transformar-se num processo real de ajuda.
Muita Paz.
C Zedi
Caro CZedi,
Continue seguindo a intuição. Isto é que dá sentido a nossa vida.
Na verdade, a opinião do Yunus, mais do que criticar a esmola/caridade, é uma chamada de atenção para fazermos algo a mais e que seja libertador para os que estão hoje pedindo, mas que têm potencial para construir com dignidade seus destinos.
Paz e Bem!
Janio
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